Descrição

Este projeto está intimamente ligado à criação artística do ator, suas abordagens, reflexões e métodos. Ele está no âmbito da pesquisa do corpo cênico, de seus movimentos e de sua continua (re)significação perante quem o assiste e, por sua vez, da sua própria (re)organização.
Para isso, cartografei meu próprio processo de aprendizagem e criação através dos diálogos entre o método de educação do movimento, Body Mind Centering®, inicialmente desenvolvido pela americana Bonnie Bainbridge Cohen, das formas de extração e codificação de matrizes corporais mapeadas por Renato Ferracini, e dos princípios da performance estudados por Renato Cohen.
Assim, o desafio desta pesquisa foi a utilização do material perceptivo, proveniente da prática corporal, para a elaboração cênica. Ou seja, transcrever as sensações em matrizes codificadas, visando uma apresentação final em que este procedimento fosse (in)visível.

PESQUISA DE MESTRADO
CONCLUÍDA
ORIENTADOR: PROF. DR. ARMANDO SÉRGIO DA SILVA

19.11.09

Impressões Orgânicas

Para Hartley, a vida emocional e o senso de identidade se desenvolvem a partir das reações e ações às primeiras experiências (comer, digerir, eliminar). Os órgãos nos conectam aos nossos sentimentos e reações viscerais: emoções cruas, ilimitadas e sem censura. Quando focalizamos a atenção em um órgão específico, experimentamos suas emoções e percebemos nossas atitudes, balanceando e reorganizando as relações entre funções psíquicas e físicas como um todo”. (1995, p. 183)
O sistema orgânico, de acordo com o BMC®, está vinculado à expressão e memória das emoções. E, cada atividade orgânica gera diferentes pensamentos e qualidades de movimento que refletem suas estruturas, substâncias, tamanhos e posições no corpo.
Eles modulam o tônus da postura óssea através de suas próprias modulações em relação à gravidade e outras forças externas. Os órgãos possuem um “esqueleto” interno formado por finos tecidos conjuntivos que se ramificam em seu interior e, também, preenchem a respiração celular, tornando-os vivos e presentes. Isso significa que a consciência celular garante a consciência da presença orgânica. Os órgãos se expandem em seus próprios espaços quando suas células respiram livremente. Como um balão cheio de ar que possui uma forma e um volume que suporta seu entorno e é suportado pelo ar que contém. Portanto, cada órgão apoia a si mesmo e a outros órgãos ao seu redor, promovendo plenitude e presença a todo sistema músculo-esquelético.

Deitada afim de entregar meu corpo ao apoio do chão, perceber a atuação da força da gravidade e relaxar a musculatura, facilitei a sensação da presença orgânica com uma bexiga com água quente. Sua forma, volume e densidade correspode sensivelmente as caracteríticas de um órgão e facilita seu convite à expressão.
Primeiramente, pousei a bexiga sobre a boca, início do sistema digestório. Visualizei. Percebi. Boca, dentes, língua, mucosas internas, palatos, saliva. Movimentos. Cavidade. E, logo, deu uma vontade enorme de engolir a bexiga. A boca se expandiu. A caverna cresceu e relaxou. A bexiga rolou para o pescoço. A faringe “deitou” sobre a coluna cervical. Sequenciou pelo esôfago, percorreu a coluna e encontrou o estômago. Focalizei minha atenção sobre ele. Imaginei a presença de seu suporte interno e, aos poucos, através da respiração no órgão, permiti sua corporificação. Ou seja, em cada inspiração visualizava e sentia sua expansão; durante a expiração uma luz interna o sustentava, mantendo seu volume. Explorei os sons emanados de sua respiração interna.
Vibração... Luz escura... Adormeci... Acordei...
Os intestinos deram sensação de preenhimento e peso ao abdômen. Dobras. Contrações e relaxamantos. Sou víscera, excremento, nutrição e vida.


Deixo meu corpo no chão. Focalizo a atenção na respiração - inspirar e expirar - expandir e encolher - mundo interno e externo - troca constante. A gravidade age sobre meus ossos, músculos e órgãos. O chão abraça o corpo e respira. Prolongamento.
Pouso a atenção no coração. Bombeamento, pulsação, circulação, nutrição, recolhimento, vida e morte, densidade, volume. Tempo... Viro de bruços - o coração é apoiado pelo chão. O chão pulsa. O coração tem peso.
...


Deixo o coração escorrer energeticamente para as mãos. Conexão entre órgão, ossos e músculos. Coração-centro no meio do peito. Triângulo com as mãos. Apoio, sustentação e mobilidade.
Inicio movimentos a partir dessas relações de estabilidade e mobilidade.
Coração-mãos.
Let it go...


Sentada na cadeira – trabalho com tônus – tônus baixo sem prontidão / passividade / olhar baixo - ar.
Criação de pequenos impulsos orgânicos de mudança postural e impedimento de suas realizações / vontade de sair da posição passiva.
Olhar o cego – parti de um desses pequenos impulsos, os olhos viram o cego imaginário. Os olhos chamam a boca-desejo / oposição da matriz peitoral e abdominal / foco no fígado como apoio para o movimento opositor / retorna à posição inicial com tônus mais elevado (pequena tomada de consciência) / as mãos iniciam um movimento de rotação pelos dedinhos.
O coração inicia a rotação da matriz peitoral em direção ao cego / rotação das mãos pelos dedinhos na atitude de agarrar / oposição da cabeça que vence.
Novamente o coração e as mãos que levam a cabeça – olhar e boca.
Nojo de si mesma - a boca continua o movimento em direção ao cego e levanta a personagem da cadeira / salivação / percepção da saliva e do tubo digestivo (saliva e fezes) / percepção do aparelho respiratório (muco) / percepção das vísceras (sangue e tripas). Vontade de descolar e tirar todos os órgãos do corpo / peso dos órgãos.













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